A maneira como lidamos com os tantos estímulos que recebemos das mídias, do trabalho e dos nossos anseios pessoais modela as nossas necessidades, e é a partir delas que nos movemos no dia a dia. Mas o que é realmente essencial para viver bem? Será que realmente precisamos das coisas que buscamos? A resposta a essas perguntas, sem dúvidas, é subjetiva, porém muito importante, em especial quando se trata do cuidado e da educação das nossas crianças. Viver num ambiente com excesso de estímulos pode gerar sintomas de estresse nas crianças, conforme afirma a pediatra Dra. Lygia Mendes dos Santos Border. Por esta razão, a talentosa e atenta estrela-arquiteta Renata Dutra, especialista em arquitetura infantil, vai nos ajudar a entender o que é o essencialismo e como essa filosofia pode ser aplicada no cotidiano da sua família.

O que é o essencialismo?
A palavra “essência” designa aquilo que é a mais importante característica de um ser ou algo, ou seja, a essência não pode ser incutida em nós por agentes externos, ela é intrínseca. No nosso contexto, marcado pelas redes sociais, aplicativos e suas inúmeras informações e estímulos; pelas muitas possibilidades de escolha e compra, temos que lidar diariamente com uma série de necessidades a serem atendidas, sejam elas de cuidados com o corpo, com a mente, com o trabalho e principalmente com as crianças.
A eterna busca pelo atender a essas necessidades, além de frustrante, é cansativa e nos afasta de nós mesmas. É o que o psicólogo estadunidense, formado na Universidade da Pensilvânia, Barry Schwartz define como o paradoxo da escolha. Quanto mais opções temos na hora de escolher, melhor será essa decisão, certo? Nem sempre. O excesso de opções de escolha faz com que gastemos muito tempo escolhendo e pode, ao final, gerar a sensação de que fizemos uma escolha errada. Afinal, se havia tantas outras opções, provavelmente minha escolha não é a melhor. Isso significa que fazer uma escolha com segurança é melhor do que escolher a opção ideal. É daí que chegamos à importância do que é essencial em nossas vidas. Mas então como definir o que é essencial?

Renata define o essencialismo na prática como uma maneira disciplinada de tomar decisões com foco no que é essencial para você e para aqueles pelos quais você é responsável, a partir da realidade que cada um de nós vive, e também da vida que queremos construir para nós e nossa família. De acordo com o essencialismo, podemos fazer menos, porém melhor, com objetivo de alcançar nossa melhor contribuição para o mundo, desempenhando de maneira bem feita aquilo que consideramos essencial.
Greg Mckeown afirma na obra “Essencialismo” que não se trata de um método para gerenciar melhor o tempo e ser mais produtivo, mas sim uma estratégia de vida, com a qual identificamos o que é essencial de acordo com nossos valores e aquilo que almejamos, e contribuímos com nosso máximo para aquilo que consideramos realmente importante.
Note aqui a diferença entre essencialismo e minimalismo. A arquiteta ressalta que, embora sejam próximos, o minimalismo consiste em eliminar o que é superficial, com objetivo de reduzir o consumo, ao passo que o essencialismo parte do conhecimento de nossas reais necessidades e da disciplina de buscar atender a elas, o que também gera a diminuição do consumo.
Mas como isso se aplica às crianças?
O pesquisador John Paine observou que muitas crianças de bairros de classe média de Londres apresentavam sintomas similares aos de crianças abrigadas em campos de refugiados e diagnosticadas com estresse pós-traumático. Ele apontou que muitas crianças de hoje podem estar sofrendo da “reação de estresse acumulado”, o que pode provocar aumento de cortisol no sangue, afetando a mente, a concentração, o temperamento, além de provocar alergias, tensões musculares, depressão e ansiedade.

O estresse observado pelo pesquisador não está relacionado aos desafios comuns e saudáveis do desenvolvimento e da idade em que está a criança, já que sabemos o quanto crescer e aprender é desafiador. Trata-se de um tipo específico de estresse que interfere na concentração, no foco, na habilidade de resiliência mental e emocional. Em suas pesquisas, ele chegou à conclusão de que nós, adultos, estamos construindo dinâmicas familiares, e obviamente o ritmo de vida dos nossos filhos, a partir de quatro pilares do muito:
- muitas coisas;
- muitas escolhas;
- muita informação;
- muita velocidade.

Ele afirma que “(…) as crianças são seres táteis. Elas vivem tão plenamente pelos seus sentidos que, se veem algo, também querem tocar, cheirar, dependendo da idade colocar na boca, talvez jogar no chão, colocar em cima da cabeça, e até mergulhar o objeto na água, se isso for possível. É natural. É assim que exploram o mundo. Mas imagine a sobrecarga sensorial que pode acontecer a uma criança quando todas as superfícies, gavetas e armários estão cheias de coisas? Tantas escolhas e tantos estímulos roubam-lhes tempo e atenção. O excesso de coisas priva as crianças da sua capacidade nata de explorar o mundo tão profundamente.”
Mas como podemos aplicar o essencialismo no cotidiano da família?
Primeiramente, é necessário um trabalho de autoanálise e autoconhecimento.
Faça perguntas como: o que é vital para nós nesse momento das nossas
vidas? Ou: o que é essencial para que alcancemos nossos objetivos? Será que isso é realmente importante, considerando a demanda de trabalho e energia que vamos desprender para alcançar?
E como aplicá-lo no cotidiano da criança?
No que se refere às crianças especificamente, trata-se de um exercício sensível de percebê-las. O que costuma despertar realmente a curiosidade dela? O que aparentemente a deixa cansada ou desestimulada? Quais são suas reais necessidades emocionais, práticas e ─ por que não ─ estéticas?
Sem dúvidas, é um acompanhamento contínuo, até porque é da natureza da criança estar em constante mudança e desenvolvimento. A partir desses pontos, é necessário ter a ousadia de excluir o que é trivial, impor limites aos estímulos e se descomprometer de fato com o que não é essencial para a família. Embora possa parecer muito difícil, lembre-se de que
o essencial é muito prazeroso, e atendê-lo nos leva a uma real satisfação e conexão conosco e com os que amamos. Além disso, ao diminuir as demandas, acabamos por ter mais tempo para aproveitar e aprofundar o que mais gostamos, nos aproximando ainda mais da felicidade.
Outra ferramenta que pode ser útil nos momentos em que as demandas secundárias parecerem sedutoras é o Mindfulness ou atenção plena, técnicas que ajudam a ter mais presença e nos manter firmes no propósito escolhido. Quer saber mais sobre estas ferramentas? Confira nosso artigo, “Mindfulness: o treinamento da mente que melhora o estresse e a qualidade de vida,” aqui na Stellar. Para mergulhar ainda mais nesses e outros temas relacionados a eles, conheça nossos conteúdos de Saúde e Bem-Estar.